
O pensamento é o resultado do passado a atuar no presente; as vagas do
passado estão de contínuo submergindo o presente. O presente, o novo, está
sempre sendo absorvido pelo passado, o conhecido. Para se viver no presente
eterno, é necessário morrer para o passado, para a memória; nesta morte há
renovação, sem a limitação do tempo.
Estende-se o presente para o passado e para o futuro; sem compreender-se o
presente, fica- nos fechada a porta para a compreensão do passado. É tão
fugaz a percepção do que é novo; nem bem o sentimos e já o submerge a
rápida corrente do passado, e o novo deixa de existir.
Morrer para todos os dias passados, viver cada dia renovadamente — tal só é
possível se formos capazes de estar passivamente vigilantes. Nessa
vigilância passiva nada se nos acrescenta; nela há uma tranquilidade
intensa, na qual se assiste ao desenrolar perene do novo, na qual o
silêncio se estende infinitamente.
Procuramos servir-nos do novo como meio de destruir ou consolidar o velho,
e com isso corrompemos o presente, em que palpita a vida. O presente
renova, e dá-nos a compreensão do passado. É sempre o novo que dá
compreensão, e na sua luz assume o passado um significado novo e
vivificante. Quando ouvimos uma coisa nova, ou a sentimos em nós, nossa
reação instintiva é compará-la com o velho, com algo já conhecido e
sentido, com uma lembrança já quase a apagar-se. Essa comparação dá força
ao passado, desfigura o presente, e por essa razão se transforma o novo
sempre em coisa passada e morta. Se fosse o pensamento-sentimento capaz de
viver no presente, sem o desfigurar, veríamos, então, o passado
transformar-se no presente eterno.
Para alguns de vós terão, porventura, estas palestras e exposições
despertado uma compreensão nova e estimulante; o que agora importa é que se
não ajuste o novo a velhos padrões de pensamento ou velhas fraseologias.
Deixai o novo como está, livre de contaminação. Se for ele verdadeiro, a
sua luz abundante e criadora dissipará o passado. O desejo de dar
permanência ao presente criador, de torná-lo prático ou útil, despoja-o de
seu valor. Deixai que o novo viva, sem estar ancorado no passado, sem a
influência deformadora de temores e esperanças.
Morrei para vossa experiência, para vossas lembranças. Morrei para vossos
preconceitos agradáveis ou desagradáveis. Morrer assim é tornar-se
incorruptível; tal estado não é de aniquilamento porém de criação. É essa
renovação que, se o permitirmos dissolverá os nossos problemas, por mais
complicados, e os nossos sofrimentos, por mais intensos que sejam. Só na
morte do “ego” haverá a vida.
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